A Escolhida | Lois Lowry

Eu não poderia estar menos ansioso para ler a continuação de um dos meus livros favoritos: O Doador de Memórias, escrito por Lois Lowry.

O livro chamado A Escolhida, teoricamente, faz parte da mesma saga de livros d’O Doador, porém não é, necessariamente, uma sequência. Arrisco a dizer (sem certeza) que o segundo livro da quadrilogia acontece ao mesmo tempo que o primeiro, em uma sociedade completamente diferente.

Aqui, já não temos Jonas e muito menos a sociedade em que ele vivia. Agora, nós conhecemos Kira, uma moça de duas sílabas que vive num vilarejo muito pobre próximo à floresta. Neste vilarejo, as pessoas se mantêm abaixo do Conselho dos Guardiões, os responsáveis pelo poder jurídico e pela ordem na sociedade.

Não sabemos ao certo quantos anos a personagem tem, visto que as pessoas são nomeadas de acordo com o tempo. Ao nascer, a criança recebe uma sílaba e só recebe outra quando vira adolescente, e assim sucessivamente. É muito difícil, por exemplo, uma pessoa se tornar idosa e ter um nome de quatro sílabas.

A adorável Kira é deficiente de uma das pernas e é mal vista pelos seus vizinhos por ser considerada inútil, tanto no trabalho como na vida social. A situação piora quando sua mãe, uma artesã nata, morre, deixando-a só. E, isso faz com que a população insista em levar Kira ao Campo de Partida para ser entregue às feras. 

No entanto, devido aos ensinamentos artísticos dados pela mãe desde criança, o Conselho decide destinar Kira à restauração da túnica do Cantor, o bem mais precioso da sociedade, a fim de manter vivas as imagens do passado. Para eles, a túnica é considerada um resumo real e vivo da Ruína, ao passo que o cantor representa o poder artístico e criativo das pessoas.

Nesta história, as crenças são o ponto forte. A crença na túnica e no cajado do Cantor, a crença na Ruína, a crença nas feras e na desconfiança das pessoas umas com as outras. Posso citar, por exemplo, o momento em que Kira comenta sobre dois pedaços de madeira cruzados na parede do Edifício do Conselho, um objeto que representava bondade durante a Ruína.

Outro ponto bastante interessante é de que Kira vive sob a pressão de uma sociedade presa ao passado e em busca de um futuro perfeito, assim como em O Doador de Memórias. É como se a Ruína fosse o inferno e os personagens estivessem no purgatório, de modo que as atitudes das pessoas influenciassem, ou não, a ida deles ao paraíso.

A escrita da autora continua lenta e ainda consegue, com maestria, desenvolver detalhes envolventes em poucas páginas. E, é isto o que explode a cabeça do leitor em devaneios e torna as histórias de Lois excepcionais. 

A distopia contesta muitos dos problemas sociais, colocando em xeque nossos valores. A autora transforma uma história aparentemente simples num mind-blowing incrível.

É uma pena que “Gathering Blue” tenha se tornado, simplesmente, A Escolhida. Digo isto pois, numa tradução boba, “Buscando Azul” teria sido um título muito melhor e mais significativo pra história.

Apesar do livro e da autora terem me conquistado desde o início, A Escolhida não foi tudo aquilo que eu esperava. Mas, mesmo assim, indico a todos que leiam e tentem pensar fora da caixa, para que vocês se sintam, assim como eu, ainda mais ansiosos pelas continuações.