Fim | Fernanda Torres

Fernanda Torres, em uma de suas interpretações mais bonitas, recita em vídeo no Youtube “Necrológio dos Desiludidos do Amor”, de Drummond. Diferente da tônica mais lírica, parnasiana dele, o poema rasga em concreto duro, quase que sadicamente, as contradições e as dores de amar, que muitas vezes envolve hipocrisias, vinganças e crueldades que o sentimento toca. “Os desiludidos seguem iludidos, sem coração, sem tripas, sem amor”. Um prato cheio para a densidade e o sarcasmo de Torres, que destila tanta realidade venenosa como a do poema em seu magistral Fim, romance lançado pela Companhia das Letras e dica deste post.

À primeira vista, o livro pode ser visto como uma divagação sobre envelhecimento, principalmente nos relatos em primeira pessoa das pessoas no último instante antes da morte – eles se revezam com o narrador contando os efeitos dela, entre reconhecimento de corpos, velórios, etc. De fato, discussões do final da vida, como a rotina solitária de hospital tida por doentes terminais, ou os “detalhes” que se tornam fundamentais como um buraco na calçada para pessoas com condições diferentes, levam a reflexões sobre o tema, mas o buraco conceitual de Fernanda é muito mais embaixo.

Em uma visão quase existencialista do mundo – a angústia pela liberdade e consequência totais das escolhas que fazemos durante a vida -, Fim é, melancolicamente, o oposto da Quadrilha (também) de Drummond: ninguém amava ninguém; todos desamavam todos. Nisso, entra a qualidade narrativa de Torres. Para cada um dos cinco (não) amigos, há inicialmente uma entrada profunda em seus sentimentos, angústias e ressentimentos com relação aos anteriores, em monólogos psicológicos pessoalíssimos – o de Sílvio, por exemplo, é regado a um carnaval tão decadente e com perda total do limite, como uma própria metáfora do personagem, e o de Ciro em uma cama de hospital, com uma crise de consciência tão triste quanto ele próprio -, e depois uma terceira pessoa fria e ferina de propósito: eles merecem.

Nessa “cama de gato”, vão se entendendo os ódios. Todos, em algum momento, foram ruins com os outros, por amor, poder, ego, ou simples e puro egoísmo. O Rio de Janeiro, sexto “personagem” do livro, passa do luxo das festas e dos anos dourados ao lixo cotidiano, acompanhando-os. Talvez seja isso que, sem dó do leitor, Torres mostre: os humanos são egoístas por natureza, e não há amizade – nem relação – eterna. Tudo é, mundanamente, uma transição ininterrupta. Com uma redenção quase catártica no fim, ela segue os passos do poema que recita no vídeo, e mostra que o aqui se faz, aqui se paga vale o preço, porque a justiça é funcional para os bons também.

“As amadas dançarão um samba bravo, violento, sobre a tumba deles”. Dá-lhe Drummond, e dá-lhe Fernanda!

Texto colaborativo. Créditos: Bruno Jacob
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Cristiam Oliveira

22 anos, se formou em administração mas gosta mesmo de comunicação. Tem uma paixão enorme por cinema e adora, sobretudo, os livros. É muito organizado, calmo, chato e grudento; se apega muito fácil às pessoas que gosta e, às vezes, é extrovertido. Adora mudar e criar coisas; é muito curioso e persistente em tudo que faz. Gosta de cachorro mas prefere gatinhos (inclusive tem dois!).

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5 comentários:

  1. Tinha gostado da capa, mas o conteúdo não me atraiu tanto... Talvez lendo o livro eu goste, mas só lendo resenhas, essa e outras, eu não gostei.

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  2. Este está na minha meta de leitura.... mas assim bem lá no finalzinho mesmo...

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  3. Realmente a capa chama mais a atenção, do que a história zZzZzZzZ

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  4. Só uma opinião pessoal: A resenha começou meio estranha. Se é que teve um começo. Lembrando que essa é só uma crítica construtiva, que eu acho que pode melhorar (ou não) a resenha.
    Achei a história meio cansativa, mal tive vontade de ler...

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  5. A capa chama muita atenção já a historia não sei não, mas quem sabe depois de ler eu goste.

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