Filme: Promessas de Guerra

Quando fui convidado a escrever sobre Promessas de Guerra, me pairou no ar uma dúvida: conseguiria enfim Russell Crowe construir um personagem diferente de tantos outros déjà vus em sua carreira? Digo isso porque não vejo muita diferença no Gladiador, Robin Hood e Noé que ele fez – todos heróis que encaram sacrifícios corajosamente em prol de um bem maior, visto em si mesmo ou (majoritariamente) na humanidade. Para minha grata surpresa, o agora também diretor conseguiu escapar com elegância dessa armadilha, a partir de um enredo que mescla ação e emoção (certamente, não existirá briga de casal na escolha desse filme), e uma filmagem seca – tanto literalmente, no deserto australiano e nas trincheiras turcas do começo do século XX, quanto em metáfora, com várias colagens de cenas não lineares, para realmente fisgar o (já pouco) fôlego do expectador.
É nessa ponte aérea (na época marítima) entre Austrália e Turquia que se dá o estopim da história: Joshua, personagem de Crowe, e sua mulher, perderam seus três filhos na batalha de Gallipoli há quatro anos. Cada um foge de um jeito da dor: ele procura água com seu cachorro embaixo da terra, e ela finge que ainda tem seus garotos pedindo para o pai ler histórias enquanto eles “dormem”. No entanto, o suicídio da mãe (em uma das muitas sequências fortes do longa), dá um duro estalo de consciência no protagonista: teria sido culpa dele a morte dos filhos, ao cair em uma armadilha nacionalista que o impediu de segurá-los? Para compensar essa suspeita, ele vai atrás dos corpos, e começa um enredo clássico de sacrifício e resgate, com inimigos que se tornam amigos – e vice-versa, claro -, amores e sentimentos familiares “proibidos”, muitos flashbacks de guerra, e uma cena final “cabeça” que reúne todos os símbolos coletados durante as duas horas para amarrar os nós.
Por que, então, ver Promessas de Guerra, que como dito no começo parece igual a infinitos outros do gênero? Primero, porque gostamos do gênero! Com bons efeitos, andamento alucinante e atuação competente de Crowe – não só dele como do bom elenco turco escalado para papéis-chave -, a busca dos filhos perdidos escapa dos clichês até nas necessárias (?) frases de efeito, o romance/enredo emocional fica na medida certinha do que esperamos em filmes assim (explorar caminhos psicológicos em vários momentos através da culpa foi um grande acerto), e as ótimas cenas de violência se inserem em um contexto aceitável para os que tentarem julgá-las pelo politicamente correto – há bons valores ensinados a partir disso.

Segundo e não menos importante, porque há muito de história e de cultura nas cenas que intermediam a linha principal do longa: as filmagens de Istambul são belos refrescos para os olhos, e hábitos culturais – muitas vezes influenciados pela religião -, como o de ler a sorte na borra de café, o de circuncisar os meninos, o de aprender a “lábia turca” desde novo, e o de manter costumes tradicionais de casamentos (mesmo para o início do século passado), são bagagens interessantes que Russell insere como diretor na trama. Além disso, a queda do Império Otomano em várias invasões que o fragmentaram fatalmente – como a inglesa, mostrada em detalhes, e a grega, pincelada no final -, é mostrada de forma prática, e também agrega valor ao resultado do filme.

Há sim muita humanidade para contornar a seca, e muito Russell Crowe de reserva para gastar. No entanto, há também um longo – e nesse caso valoroso – caminho para isso.



Texto colaborativo escrito por: Bruno Jacob

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