Livro: Anardeus, de Walter Tierno

Anardeus é muito difícil de resenhar. Juntamente com Graça Infinita, entra na lista de obras que mais me deram trabalho para opinar. Não que o livro seja difícil ou grande demais. Pelo contrário. A rápida e fluída linguagem do jornalista Walter Tierno não deixa espaço para cansaço durante as páginas. O grande diferencial do livro - e que o torna tão complexo de ser resenhado - é a história.

A obra de Tierno conta a história de Anardeus, um homem que nasceu feio, cresceu esquecido e não consegue se adequar ao mundo que existe ao seu redor. Além de odiar todas pessoas que o cercam, Anardeus só sente frio. O calor, curiosamente, só é sentido por ele quando alguém sofre. Por isso, o que mais satisfaz o personagem principal é a dor, o sofrimento. Precisa de mais alguma explicação de porque Anardeus é afastado da sociedade?

Toda essa história - que não pode ser contada mais do que isso, senão perde a graça para os futuros leitores - é contada sob o ponto de vista de três personagens: o próprio Anardeus; a irmã dele, Isabel; e o Fotógrafo, um personagem curioso e misterioso.
Anardeus é um anti-herói, tal qual Macunaíma. Tudo nele é errado, mas ainda assim causa empatia no leitor. Isabel, por outro lado, é extremamente certinha. Talvez por isso, dos três, seja a que menos cativa.
O Fotógrafo, por outro lado, é o que mais chama a atenção, apesar de Anardeus ser um personagem ímpar. Misterioso e extremamente realista, o Fotógrafo é a razão de toda a história. A cada passagem com ele, me alegrava. Sabia que ia me divertir.
Dito isso, o que mais chama a atenção é a forma que Tierno achou para contar a história. Mesclando aspectos teatrais e narrativa convencional, o jornalista consegue passar as impressões e sentimentos dos personagens de forma direta e concreta. Não há muitas divagações.

Aliás, os trechos de narrativa teatral me incomodaram, no começo, com a total descrição do que os personagens sentiam "Eu, sustentando uma falsa indignação" ou "Amiga, choramingando" são alguns exemplos do que é visto ao decorrer da obra. Muito detalhamento de sentimento e pouco espaço para a imaginação. Enfim, incomoda, mas não estraga a leitura. 

Esta maneira de escrever, aliás, acentua ainda mais toda a perturbação causada pelo personagem Anardeus e sua história. Ao final do livro, um sentimento curioso - que mescla dó, nojo e surpresa - surge no leitor. É impossível não ficar maravilhado com a originalidade e a perturbação da obra.
Além disso, a narrativa trabalha com a mudança constante foco. Ao contrário de muitos autores, Tierno sabe trabalhar este artifício. A cada mudança, era criada uma expectativa no leitor e novos aspectos da história eram revelados.
Enfim, difícil falar mais de Anardeus. Mais detalhes estragam a experiência de quem quer ler. Então, só diga uma coisa: se quer uma literatura brasileira boa e que cause um sentimento diferente, este é o livro. Leia Anardeus.


Matheus Mans

20 anos, estudante de jornalismo. Leitor voraz de qualquer tipo de livro, cinéfilo de carteirinha e apaixonado por música brasileira. Não vive sem doses frequentes de Stephen King, Arnaldo Antunes, Wes Anderson, Woody Allen, Adoniran Barbosa, Neil Gaiman, Doctor Who, Star Wars e muitas outras coisas que permeiam sua vida.

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